Por Ana Luíza Rodrigues.
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A pandemia da COVID-19 deixou rastros incalculáveis. Uma doença que tirou muitas vidas e mudou completamente nossa rotina, onde tivemos que nos adaptar, aprender e lidar com ela. É obrigação de qualquer profissional da saúde entender as consequências da doença e manejá-la da maneira correta. Além disso, é nossa função educar o maior número de pessoas em relação às consequências que a infecção traz ao corpo humano, mesmo algum tempo depois da contaminação. O conteúdo que venho abordar hoje se encaixa no contexto esportivo. Como voltar de maneira segura a praticar esporte depois da infecção do coronavírus? Quanto tempo depois? Quais exames precisam ser feitos? Quais os sintomas que devemos ficar atentos? Qual o efeito da síndrome pós COVID na prática esportiva?
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A COVID19 é uma doença que afeta vários sistemas do corpo ao mesmo tempo. A fisiopatologia está relacionada à produção de citocinas inflamatórias e ao estado prócoagulante (NALBANDIAN, 2021), o que significa que o indivíduo contaminado apresenta uma pré-disposição a ter o aumento da coagulação do sangue e a formação de trombos.
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Os sintomas mais comuns durante a infecção são:
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- Fadiga;
- Dispnéia (falta de ar);
- Dor crônica (nas articulações e no peito);
- Tosse;
- Perda do olfato e/ou paladar;
- Queixas cognitivas – “brain fog”: dificuldade de concentração e memória;
- Queixas psiquiátricas: ansiedade, depressão e estresse pós-traumático;
- Queixas motoras: principalmente relacionadas com fraqueza muscular.
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Diversos estudos sugerem que alguns destes sintomas podem perdurar após a infecção (NALBANDIAN, 2021). O National Health Service (NHS) define a Síndrome pós-COVID como o quadro de sinais e sintomas que se desenvolvem durante e/ou após a infecção e continuam por mais de 12 semanas, sendo que não são explicados por um diagnóstico alternativo.
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Um estudo verificou que 6 meses após a infecção aguda, os sobreviventes de COVID-19 apresentavam principalmente fadiga ou fraqueza muscular, dificuldades para dormir e ansiedade ou depressão (HUANG, 2021). Os pacientes que estiveram mais gravemente doentes durante a internação hospitalar tiveram capacidade de difusão pulmonar mais grave e manifestações anormais de imagem do tórax, e são a principal população-alvo para intervenção de recuperação em longo prazo.
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Devemos ficar atentos às sequelas pulmonares e cardíacas após a infecção da COVID-19. Sequelas como a miocardite (inflamação da parede do coração pelo vírus) ou problemas tromboembólicos, se não forem identificados através de exames antes de retomar o exercício físico, podem conduzir ao desenvolvimento de embolias pulmonares, lesões cardíacas e levar à morte súbita (SALMAN, 2021). Então, seja cauteloso! Se você teve COVID e está bem do ponto de vista respiratório, não deixe de investigar também a sua saúde cardíaca. Os exames podem indicar a existência de miocardite, o que leva à necessidade de cuidados específicos e contraindicação para a execução de exercício físico de alta intensidade de até 6 meses.
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Atletas com diagnóstico de COVID-19 que possuem comorbidades como diabetes, doença cardiovascular ou renal devem obrigatoriamente ter uma avaliação médica antes de iniciar o retorno ao esporte (BAGGISH, 2020). Os principais exames investigativos são:
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- Teste de sangue para marcadores inflamatórios (alta sensibilidade-troponina, peptídeo natriurético cerebral e proteína C reativa);
- Monitoramento cardíaco (ECG de 12 derivações, ecocardiograma, testes de estresse cardíaco ou ressonância magnética cardíaca);
- Avaliação da função respiratória (espirometria);
- Monitoramento renal e hematológico.
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O prazo de retorno à atividade física varia de acordo com a gravidade da COVID-19 (SALMAN, 2021):
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- Quadros leves: No curso natural de covid-19, a infecção geralmente ocorre por volta de uma semana do início dos sintomas, desta forma, o retorno ao exercício ou atividade esportiva só deve ocorrer após um período assintomático de pelo menos 7 dias;
- Quadros moderados: aguardar 21 dias sem sintomas;
- Quadros graves (pacientes que foram submetidos à internação): de 21 dias à 3 meses.
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É necessário um programa progressivo que introduz a atividade física de uma forma gradual. Para isto, existem alguns protocolos publicados na literatura que buscam a segurança deste processo (ELLIOTT, 2020; SALMAN, 2021). Um deles divide o retorno em 5 fases levando em consideração a famosa Escala de Borg ou Escala de Percepção de esforço (SALMAN, 2021).
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Fase 1) Objetivo: Preparação para voltar à atividade física; Exercícios indicados: Exercícios respiratórios, de equilíbrio, alongamentos e caminhada lenta; Escala de Borg: Manter o nível 6-8.
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Fase 2) Objetivo: Atividades de baixa intensidade como caminhada leves e pequenas tarefas domésticas; Exercícios indicados: Caminhada lenta, ir aumentando a intensidade de 10 a 15 minutos por dia; Escala de Borg: Manter o nível 6-11; Quando avançar: Após 7 dias, quando conseguir caminhar durante 30 minutos mantendo o nível da Escala de Borg em 11.
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Fase 3) Objetivo: Atividades aeróbicas de intensidade moderada, com prova de esforço (início do treino de força); Exercícios indicados: Caminhar em um ritmo acelerado, subir e descer escadas, andar de bicicleta – 2 sessões de 5 minutos de atividade aeróbica intercaladas por repouso; Escala de Borg: Manter o nível 12-14; Quando avançar: Após 7 dias e quando conseguir treinar meia hora com recuperação total no dia seguinte.
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Fase 4) Objetivo: Atividades aeróbicas de intensidade moderada (corrida), coordenando com força; Exercícios indicados: Corrida – 2 dias de exercício intercaladas por repouso; Escala de Borg: Manter o nível 12-14; Quando avançar: Após 7 dias e quando acusar menos cansaço.
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Fase 5) Objetivo: Realizar as atividades no nível pré infecção da COVID; Exercícios indicados: Todas as atividades; Escala de Borg: Se tolerado, pode-se ultrapassar o nível 15.
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Se cuide e retorne com segurança!
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REFERÊNCIAS
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- NALBANDIAN, Ani et al. Post-acute COVID-19 syndrome. Nature medicine, v. 27, n. 4, p. 601-615, 2021.
- HUANG, Chaolin et al. 6-month consequences of COVID-19 in patients discharged from hospital: a cohort study. The Lancet, v. 397, n. 10270, p. 220-232, 2021.
- SALMAN, David et al. Returning to physical activity after covid-19. BMJ, v. 372, 2021.
- BAGGISH, Aaron et al. Resurgence of sport in the wake of COVID-19: cardiac considerations in competitive athletes. British journal of sports medicine. 2020.
- ELLIOTT, Niall et al. Infographic. Graduated return to play guidance following COVID-19 infection. British journal of sports medicine, v. 54, n. 19, p. 1174-1175, 2020.
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